Marco da geração distribuída sai da pauta por falta de consenso


O marco legal da geração distribuída (PL 5829/19), que estava previsto para ser votado nesta quinta (6), saiu da pauta do plenário da Câmara dos Deputados por falta de consenso entre os parlamentares.

Ontem, o relator, Lafayette de Andrada (Republicanos/MG), publicou um substitutivo, resultado das negociações que vêm sendo feitas há cerca de dois meses no mercado e entre os deputados.

Agora, segundo Lafayette, não há mais espaço para mexer em seu parecer. O desenho final do marco legal do setor – tema alvo de disputa entre governo, diferentes setores do mercado e parlamentares – caberá ao plenário.

A principal discordância é sobre quem paga a conta da geração distribuída.

Quem gera a própria energia têm o direito de abater o custo da eletricidade, mas também encargos que acabam rateados entre todos os consumidores. Associações que representam o setor de GD afirmam, contudo, que o saldo é positivo – isto é, os ganhos sistémico da geração descentralizada beneficia todos os consumidores.

Já os agentes de mercado que representam consumidores e distribuidoras argumentam que a solução não é sustentável enquanto for preciso ratear os custos da GD por todo o setor elétrico.

Portanto, consumidores mais ricos, que podem comprar os sistemas de geração, e empresas acabariam beneficiados por um subsídio-cruzado.

 

Pequenos e grandes consumidores

Deputados como Otto Alencar Filho (PSD/BA) tentam garantir isenção de encargos tarifários para consumidores que tenham sistemas até 500 kW de capacidade, como forma de garantir a atratividade e retorno dos investimentos feitos para gerar a própria energia.

Atualmente, sistemas até 75 kW são enquadrados como microgeração – é o perfil de consumidores individuais. A depender da fonte, como a solar, a minigeração vai até 5 MW, o que atende a grandes clientes, como shoppings e indústria ou empresas que contratam projetos de geração remota.

A maior parte dos projetos de geração distribuída utilizam painéis fotovoltaicos, seja nos telhados dos próprios consumidores ou de forma remota, em pequenas usinas construídas para este fim.  

De outro, está um grupo representado por Marcelo Ramos (PL/AM), crítico do projeto.

Nesta semana, o deputado foi às redes sociais deixar claro que há uma pendência que considera fundamental sobre o cenário após a transição e que o texto “ainda não está fechado”.

Benefícios calculados pela Aneel

À epbr, Marcelo Ramos afirmou que um caminho para o consenso é definir que a Aneel, agência federal do setor elétrico, fique responsável por calcular os custos e os ganhos da GD, para que os consumidores-geradores tenham direito apenas aos benefícios que a geração descentralizada traz para a rede.    

Com isso, a transição da regra vigente seria para o pagamento de todos os encargos, e não apenas o referente à distribuição (Fio B), como previsto inicialmente no relatório de Lafayette.

Se prevalecer, a proposta leva a discussão de volta para a Aneel, que entende que a GD se beneficia de um subsídio-cruzado e propôs, em 2019, a retirada dos descontos após um período de transição. 

O presidente Jair Bolsonaro acabou interferindo, em apoio à campanha contra a “taxação do Sol” e chegou-se a um acordo para que a regulação seja revista no Congresso Nacional, que culminou no projeto de Lafayette.


Lafayette mudou o relatório

Entre as mudanças feitas no substitutivo, estão a redução de dez para oito anos para o pagamento do encargo referente à distribuição (Fio B) para algumas categorias de geração distribuída.

Alguns parlamentares críticos do texto consideram o período sugerido inicialmente como muito longo para que a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) banque o restante da conta. O prazo de oito anos também tinha sido sugerido pela Aneel ao relator, no início de fevereiro deste ano.

Outra mudança foi a redução de carga do que é considerado minigeração distribuída. Nas conexões de GD de fontes não despacháveis, como solar e eólica, a minigeração passa a ser caracterizada por sistemas acima de 75kW até 3MW.

Nas fontes despacháveis, como pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), a capacidade vai até 5MW.

O único ponto alvo de críticas que o relator não pretende modificar é a garantia de 25 anos nas regras atuais para quem já tiver a conexão antes da nova lei entrar em vigor.

“Acho fundamental respeitar os 25 anos porque é respeito aos contratos. O Brasil já sofreu muito com a imprevisibilidade, especialmente no setor elétrico. Quebrar isso é um sinal muito ruim para o investidor externo, porque muita gente fez captura de recursos internacionais para investir nesse setor no Brasil”, explicou Lafayette.

 

Apoio das frentes Ambiental e Agropecuária

Embora tenha encontrado dificuldade entre alguns parlamentares, o marco regulatório da geração distribuída conseguiu consolidar o apoio de duas frentes que, geralmente, atuam em posições antagônicas.

A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) solicitou o voto favorável ao texto por entender que as regras trazem segurança jurídica para pequenas e médias empresas e garante uma adaptação do mercado com o período de transição. 

Também “protege o direito dos consumidores pioneiros, que acreditaram no compromisso público, assumido pela Aneel e Governo Federal, preservando a segurança jurídica e evitando o risco de judicializações”, segundo comunicado da FPA.

Pontos semelhantes são levantados em carta de apoio da Frente Parlamentar Ambientalista, coordenada pelo deputado Rodrigo Agostinho (PSB/SP).

Para ele, há possibilidade de perder a chance de incentivo à fontes de energia renovável caso o projeto não seja aprovado.

“Serão evitados mais de R$ 173 bilhões em custos que seriam cobrados na conta de luz de todos os brasileiros, inclusive aqueles que não produzem energia própria”, escreveu.

06 mai 2021


Por Larissa Fafá